segunda-feira, 10 de agosto de 2015

O que as pessoas pensariam de mim?

Numa madrugada dessas, levantei da cama com vontade de escrever. Pensando muito no objeto de pesquisa da minha tese (pra quem não sabe, faço doutorado em Sociologia e pesquiso sobre "autoestima vaginal"), comecei a escrever como se eu não fosse eu, pensando em um texto introdutório, como um preambulo da tese ou de um livro ou alguma coisa que alguma mulher no mundo tivesse pensando aflitivamente. Eis o que saiu:


"Já é madrugada alta e não consigo dormir. Minha cabeça fervilha. Meu corpo está cansado, mas minha mente vagueia por tantos lugares e assuntos que mal consigo identificar. Resolvo ligar o PC, quem sabe me distrair com algo na Internet. Levanto devagar para não acordá-lo. Acabamos de fazer amor e eu não gozei. Não por “culpa” dele ou minha, mas algo me incomoda, meu corpo me incomoda, minha vagina também. Pensando nisso, ligo o PC e no escuro do quarto, apenas a luz da tela ilumina meus pensamentos agora com um foco definido. Mas não sei por onde começar, não sei o que procurar, o que falar, o que perguntar! Também não sei com quem falar sobre algo tão íntimo. Engraçado...costumo postar tantas coisas íntimas no Facebook e isso é tão difícil! Não que eu pense que poderia falar sobre isso no Facebook, jamais! Já que nem consigo pronunciar a palavra “vagina” no cotidiano, até para eu mesma essa é uma palavra obscena! Mas por que será? Às vezes fico me perguntando sobre essas coisas que costumamos fazer ou falar sem saber de onde vem... por que tanto cuidado com uma palavra que representa algo tão comum e que todo mundo sabe que temos entre as pernas? E outra coisa estranha: como uma vagina pode mexer tanto com a cabeça das pessoas? ou apenas o nome “vagina”, ou “buceta” (prefiro vagina, apesar de não gostar de falar nenhum dos dois termos). Para ser sincera, essas duas palavras nem fazem parte do meu vocabulário. Outro fato estranho: muitas mulheres adoram falar essas duas palavras (se bem que vejo as mulheres falando a primeira e os homens a segunda....é estranho também ver homens falando “vagina”, quando eles nem têm a sensibilidade de nomear da forma que é de verdade). Bem, minha vagina (outra coisa estranha: ela é minha, não é? Não é estranho falar “nela” como se fosse alguém ou alguma coisa que me pertence? Não é óbvio que ela é minha já que está em mim? Eu sou minha vagina?) é um incômodo. Ela é grande demais, os pequenos lábios são grandes e os grandes maiores ainda. Se isso já não fosse de entristecer qualquer uma (será que existem mulheres que gostam de suas vaginas desse jeito? Não tem como eu saber, já que nem tenho coragem de pesquisar sobre isso!!! Aliás, nem sei o que pesquisar...), ela não é rosadinha como deveria ser (eu acho que deveria ser, já que sou branca), e sim escura, além de não ser lisa e sim meio franzida. Definitivamente, odeio o que eu vejo, quer dizer, o que eu mal vejo, pois não tenho coragem de olhar para ela. Ela. Minha. Estranha parte de mim que me é estranha porque não quero, ou tenho medo, de conhecê-la. Aí também fico pensando: mas o que mais eu preciso saber dela além de que ela é feia e não me agrada, de que é por ela que saem os bebês, é por ela que todo mês eu sangro feito um animal abatido, é por ela que meu marido entra dentro de mim (não metaforicamente falando, é claro, e não apenas com o pênis)? Na época em que eu estudava, na escola...não havia educação sexual. Aí penso novamente: é possível pensar na vagina como outra coisa além do sexual? Eu pensei nisso agora porque me sinto incomodada com a aparência dela e isso me faz não abrir muito as pernas para o meu marido (coisa que até hoje ele me pergunta o porquê e eu, claro, não tenho coragem de dizer...na verdade, eu digo que ele que é impressão dele e sempre mudo o foco da discussão dissuadindo ele de continuar o assunto...e sempre consigo!), então...não sei, minha vagina é uma incógnita! Mas, pera...se ela é uma incógnita, eu também sou? Nós duas somos a mesma pessoa, não somos? Não sei o que pensar...não costumo pensar tanto sobre isso, na verdade...tenho medo. O que as pessoas pensariam de mim se soubessem que me ocupo desses assuntos?".

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Se você sabe conviver com pessoas intempestivas, emotivas, vulneráveis, amáveis, que explodem na emoção: Acolha-me!"